No primeiro ano da escola, meu filho era descrito como:

  • Agitado demais;
  • Impulsivo, queria responder tudo antes dos colegas;
  • Desorganizado;
  • Perdia o foco com facilidade.

A professora falava com carinho, mas a preocupação estava ali. Fizemos uma avaliação: o laudo apontou traços de TDAH e ansiedade social.

No segundo ano, a mesma coisa. Nova avaliação. Desta vez, o TDAH veio com sobrenome: impulsividade.

Diagnóstico ou desculpa?

O pneumologista, experiente, me pergunta como ele está. Eu comento sobre o diagnóstico e ele solta, com aquele ar de desdém: “Ah… hoje em dia tudo é TDAH”.

O otorrino, mais prático, me pergunta como ele está na escola. Digo que bem. Ele torce o nariz.

De fato, hoje tudo parece ser TDAH. Mas isso me incomoda menos do que outra coisa: estamos terceirizando nossas crianças.

Pai, professor e observador

Sou pai de dois meninos. Tenho 42 anos. Dou aulas de arte marcial para crianças, adolescentes e adultos.

E vejo isso não como médico, nem como psicólogo. Vejo como pai e como educador: a gente não tem mais tempo, nem paciência, nem escuta pra nossas crianças. Quando aparece algo desafiador, vem o laudo. Vem a sigla. Vem o alívio.

Não preciso mais entender aquele comportamento. É o TDAH. Ah, então tá. Entrego para os especialistas e sigo a vida.

O perigo do rótulo vazio

Não sou contra diagnósticos. Pelo contrário. Eles abriram muitas portas para entendermos como nosso cérebro funciona de formas diferentes.

Mas quando o rótulo vira atalho para adultos cansados e sobrecarregados, ele se torna uma parede, não uma janela.

Muitas vezes o laudo alivia a culpa. Sinto isso. Mas também percebo: meu filho precisa de mim. E não só no consultório. No olhar, no afeto, no dia a dia. No jeito de falar com ele. No tipo de brincadeira que propomos. No ritmo da nossa casa. Nas perguntas que deixamos de fazer.

Neurodiversidade é neurodiversão

Aqui começa o Neurodivertido. Não como um lugar de respostas prontas. Mas como um espaço para refletir.

Vamos falar sobre o cérebro das crianças. Mas não com linguagem de neurociência. Com linguagem de pai, de mãe, de professor.

Vamos pensar juntos:

  • Como educar sem rotular?
  • Como brincar com propósito?
  • Como respeitar os limites e ampliar possibilidades?

O Neurodivertido entra como ferramenta pedagógica, emocional, social e motora. Mas acima de tudo, como um jogo de escuta e relação.

Para finalizar

Não é fácil ser pai. Nem mãe. Nem professor. Mas podemos aprender juntos.

E talvez, possamos rir mais. Brincar mais. Observar mais. Escutar mais.

Porque por trás do rótulo, ainda existe uma criança. E ela merece mais do que um laudo: merece presença.